A cerâmica e o ecoturismo em São Paulo: Trilha dos Monumentos Históricos Caminhos do Mar
Painel em cerâmica “Estradas de Rodagem” (1923), localizado no Pouso Paranapiacaba, Rodovia SP-148 Caminho do Mar, Cubatão (SP). Fotografia: Denis Giannelli.
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Em sua última matéria para o blog, a Reveste Online apresentou ao leitor a a arquitetura de Brasília e a cerâmica de Athos Bulcão. Desta vez, nossa viagem nos leva a outro canto do Brasil. Visitamos o Parque Estadual da Serra do Mar, no Estado de São Paulo, mais especificamente a Trilha dos Monumentos Históricos Caminhos do Mar. Por lá, combina-se a natureza exuberante da Mata Atlântica com a tradição cerâmica do Brasil.
O eco-percurso ao longo da antiga “Estrada Velha de Santos” (SP-148), atualmente convertida em trilha para visitantes, permite-nos visitar as construções revestidas em azulejo e ainda apreciar a fauna e a flora locais em nossa caminhada. Junte-se a nós nesta aventura, que vai desde a borda do planalto paulista, em São Bernardo do Campo, até a baixada santista, em Cubatão.
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Breve Histórico
Conhecida popularmente como ‘Serra do Mar’, a área que visitamos é, do ponto de vista geomorfológico, uma ‘escarpa de falha’. Independentemente do nome adotado, o fato é que, ao longo da história do Brasil e de São Paulo, atravessá-la do litoral rumo ao interior – e vice versa – sempre foi um grande desafio aos viajantes.
Diversos caminhos foram abertos, desde a Trilha do Tupiniquim (pré-colonial), o Caminho do Padre José (colonial) e até mesmo a famosa Calçada do Lorena, aberta em 1792 e cuja visitação é possível até os dias de hoje graças ao restauro de um de seus trechos.
A antiga Estrada da Maioridade, concluída em 1846 durante o período imperial, passou por uma série de melhorias de infraestrutura, sendo renomeada para Estrada do Vergueiro (1864) e para Caminho do Mar nos anos 1920. Nesta época, em virtude do centenário de independência do Brasil (1922), o presidente Washington Luís ordenou a construção dos monumentos que aqui apresentamos, autoria do Arquiteto Victor Dubugras.
Com o desenvolvimento industrial da região e o aumento do tráfego, a construção da Rodovia Anchieta SP-150 (pista Norte em 1947 e Sul em 1953) e da Rodovia dos Imigrantes SP-160 (pista Norte em 1974 e Sul em 2002) progressivamente desviou o fluxo de veículos da Caminho do Mar SP-148. Entre 1992 e 2004, a Rodovia Caminho do Mar foi reformada, e o trânsito de veículos deu lugar ao Polo Ecoturístico Caminhos do Mar.
Como chegar?
A Trilha dos Monumentos Históricos Caminhos do Mar é acessível a partir de seus dois portais, o de São Bernardo do Campo (SP-148 Km 42) e o de Cubatão (SP-148 Km 51, próximo à Refinaria Presidente Bernardes). Em função da proximidade com a cidade de São Paulo e pelo fato de a descida ser preferida em relação à subida, a administração do Parque Estadual Serra do mar permite a visitação supervisionada a partir de São Bernardo do Campo.
Infelizmente, não há sistema de transporte público disponível para acessar o parque. Para quem vem de São Paulo, o acesso por veículos particulares é feito pela Rodovia Anchieta SP-050 seguido pela própria Rodovia Caminho do Mar SP-048 em trecho ainda percorrível por automóveis. O trajeto desde a Praça da Sé é de 41,3 Km e dura aproximadamente 54 minutos.
Nosso roteiro
A Reveste Online preparou exclusivamente para os leitores de seu blog um registro carto-fotográfico com os principais destaques da Trilha dos Monumentos Históricos da Serra do Mar. Confira abaixo os pontos de parada selecionados, a cerâmica dos monumentos históricos, as vistas panorâmicas ao longo do percurso e as nossas dicas para aqueles que desejam aventurar-se!
COTA 738 m | Portal e Estacionamento
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Nosso ponto de partida é o Portal em São Bernardo do Campo, local onde o visitante deve obrigatoriamente apresentar-se e comprovar o agendamento da visita guiada. Próximo ao portal, um amplo estacionamento oferece comodidade para que o visitante deixe seu veículo em segurança.
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A partir do estacionamento, o visitante caminha por aproximadamente 1300 metros em trecho ainda plano na borda do planalto paulista, antes da descida da Serra do Mar. Nessa porção da trilha, é possível apreciar a paisagem do Reservatório Rio das Pedras, um braço do sistema de abastecimento de água Billings e que serve como fonte para a usina Henry Borden, como veremos adiante.
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COTA 730 m | Casa de Visitas do Alto da Serra
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Ao atravessar o Reservatório rios das Pedras, é possível avistar a divisa de municípios entre São Bernardo do Campo e Cubatão. Neste ponto, logo antes do trecho de descida, um desvio de 500m ao longo da Estrada do Mirante nos leva ao atual Centro de Apoio ao Visitante.
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Esta construção, datada de 1926, é a antiga Casa de Visitas do Alto da Serra. Servia para hospedar visitantes que vinham conhecer as obras do Alto da Serra e da Usina de Cubatão, atual Henry Borden. Seu estilo arquitetônico é marcado pela generosa varanda e o emprego da madeira. Atualmente a casa é um centro de apoio ao visitante e abriga exposição sobre a Usina Henry Borden.
COTA 712 m | Pouso Paranapiacaba
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Ao retornar à rota principal, nossa segunda parada acontece a 800 metros do início da descida, no Pouso Paranapiacaba. Construído em 1922, era o ponto de parada de carros durante a viagem pelo Caminho do Mar, e homenageia a era automobilística.
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A palavra ‘Paranapiacaba’ é de origem indígena, e significa ‘local de onde vê o Mar’. A partir deste ponto, dada a localização e altitude da construção, o visitante pode realmente apreciar a paisagem exuberante da Baixada Santista. Em nossa visita, tivemos a sorte de observar macaquinhos em seu habitat local !
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Tanto no interior como no exterior deste edifício, é possível apreciar os belíssimas obras em cerâmica que contam um pouco da história do Estado de São Paulo. Um grande destaque é o painel ‘Estradas de Rodagem’, de 1923, que representa as estradas paulistas à época. Além desta peça, as fachadas são revestidas também por composições geométricas em azulejo.
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COTA 695 m | Ruínas
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Ao continuar a descida por mais 300 metros, chegamos a uma escadaria de pedras que dá acesso às ruínas. Estas antigas construções datam dos anos 1920 e abrigaram os funcionários que trabalharam durante a construção dos Monumentos do Caminho do Mar. Do alto, é possível apreciar vistas da baixada.
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Das ruínas até nossa próxima parada, passamos por um trajeto mais extenso. O tempo ensolarado permitiu registrar paisagens marcantes, dando zoom em alguns marcos de destaque.
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COTA 626 m | Usina Henry Borden
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Em um dado momento do percurso, atravessamos a tubulação da Usina Henry Borden, que marca a paisagem daqueles que percorrem o sistema Anchieta-Imigrantes. No alto, é possível observar a Casa de Válvulas da Usina. Este edifício é acessível a partir da Estrada do Mirante e faz parte do complexo de obras Monumentos do Caminho do Mar.
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COTA 538 m | Belvedere Circular
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Após o trecho da Usina Henry Borden, a descida fica mais acentuada e a vegetação começa a mudar conforme o clima local. Chegamos finalmente ao Belvedere Circular, edifício construído em 1922 e que marca o primeiro cruzamento entre a Calçada do Lorena e a a Caminho do Mar. É um ponto de parada e mirante da paisagem local.
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COTA 520 m | Calçada do Lorena
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Construída em 1792 e parcialmente restaurada em 1992, a Calçada do Lorena é o primeiro caminho pavimentado com pedras na região da Serra do Mar, ligando São Paulo ao antigo Porto de Cubatão. Por aqui, as mercadorias eram transportadas em lombo de mulas. Além disto, a calçada marca a História do Brasil, pois foi por ela que Dom Pedro I, em setembro de 1822, subiu para São Paulo logo antes de proclamar a independência do Brasil.
No trecho atualmente acessível da Calçada do Lorena, de 200 metros de extensão, é possível imaginar a dificuldade de subir e descer a Serra do Mar na época colonial.
Em trecho superior da Calçada do Lorena – acessível apenas pela Estrada do Mirante, no trecho do planalto – existe o Monumento ao Pico, marco inicial deste caminho.
COTA 464 m | Rancho da Maioridade
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Caso o visitante opte por continuar o percurso convencional – e portanto não via Calçada do Lorena -, a descida de 800 metros leva ao Rancho da Maioridade. Construído em 1922, era outro ponto de descanso durante a viagem entre São Paulo e Santos. Seu nome é uma alusão à Estrada da Maioridade, de 1846, cujo nome por sua vez homenageia a maioridade de Dom Pedro II. Um painel de azulejos ilustra a subida da Serra por figuras políticas ilustres do século XIX, tal como o próprio Dom Pedro II.
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Cota 430 m | Padrão do Lorena
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Após uma caminhada de 300 metros a partir do Rancho da Maioridade, chega-se ao Padrão do Lorena. Construído em 1922, a obra é uma homenagem a Bernardo José Maria de Lorena, governador da província de São Paulo à época. Os painéis em azulejo na fachada representam cenas do século XVIII, como liteiras, tropeiros e mulas.
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Nossa visita à Trilha Monumentos Históricos Caminhos do Mar ocorreu até o Padrão do Lorena, após o qual retornamos para o Portal em São Bernardo do Campo. Afinal de contas, descer todo o percurso significa subi-lo a pé também! Neste sentido, aconselhamos o leitor que deseja aventurar-se a planejar seu roteiro, levando em conta o tempo necessário para a caminhada, as condições meteorológicas do dia e sua disposição física. Abaixo, apresentamos os três últimos pontos de parada para aqueles que optam pelo trajeto completo.
COTA 44 m | Pontilhão da Raiz da Serra e Portal Cubatão
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O pontilhão da Raiz da Serra está a 3.600 metros de distância do Padrão do Lorena, já na planície litorânea e junto ao Portal de Cubatão. Construído sobre o Córrego Cafezal, marca portanto o limite do trecho de serra do Caminho do Mar. Possui placa comemorativa sobre a finalização da pavimentação da Caminho do Mar, em 1925.
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COTA 8 m | Cruzeiro Quinhentista / Cubatão
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Já fora dos limites do Parque Estadual da Serra do Mar, o Cruzeiro Quinhentista é o último dos monumentos históricos que marcam nosso roteiro. Localizado atualmente na praça homônima, próximo à Refinaria Presidente Bernardes, o cruzeiro foi re-instalado na década de 1970 em função de alterações urbanísticas da região.
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O mosaico em azulejo retrata a fase inicial de penetração do território pelos colonizadores, os quais utilizaram trilhas indígenas existentes.
Dicas Importantes
Ficou interessado em fazer esta visita também? Em primeiro lugar, devido à pandemia de COVID-19, recomendamos ao leitor que se informe diretamente com o Parque sobre o período em que a trilha estará aberta ao público. Leia também nossas dicas importantes, extraídas do portal oficial do órgão gestor da trilha.
- Agendamento. É necessário agendamento prévio por telefone ou e-mail, com no mínimo 10 dias de antecedência. Sem o código de agendamento, o visitante não terá acesso a Unidade de Conservação.
- Horários: Início do passeio: 9h (tolerância máxima até as 9h30)
- Duração média do passeio: 4 a 5 horas – 9 Km
- Grupos fechados – o roteiro acontece em sentido único (caminhada subindo ou descendo a Estrada Velha), com acesso pelo município de São Bernardo do Campo e término já no município de Cubatão.
- Visitantes avulsos – organizados em grupos, os visitantes percorrem metade da extensão da Estrada Velha até a altura do monumento Padrão do Lorena, voltando pelo mesmo portão do inicio do acesso, seja por São Bernardo do Campo ou Cubatão.
- Recomendações: Usar roupas (não permitido trajes de banho) e calçados confortáveis, repelente e boné, protetor solar, capa de chuva, saquinho para lixo. Levar lanches e água. Não é permitida a entrada de animais domésticos, bicicletas, skate, motos e afins, bem como o consumo de bebidas alcoólicas.
- Atenção: Todos os roteiros são realizados, obrigatoriamente, com o acompanhamento de monitores cadastrados e capacitados segundo termos da Fundação Florestal.
muito interessante o contexto histórico descrito na matéria, parabéns!
Muito bacana ver o passeio pela perspectiva das cerâmicas. O post ficou bem completo, parabéns pelas fotos e obrigado pela referência!
Que bom que gostou do nosso passeio, Vinicius! Nós que agradecemos pela fonte das imagens.